Histórias do Caminho de Santiago de Compostela - 2006

O Caminho de Santiago de Compostela - 2006

Início do “Caminho de Santiago”
Outubro de 2006  
                       
Toda história tem um começo,  essa se deu em 02/10/2006.
Com minha "credencial na mão", lá vou eu!


A frase abaixo estava no aeroporto de São Paulo... é pra se pensar!


Sai de Araras, cidade no interior de São Paulo, às 14 h.      Ao chegar à Estação Rodoviária do Tiete fui comprar uma passagem para o Aeroporto de Guarulhos, R$ 26,70, achei um absurdo!    Eu achei um absurdo, duas moças que estavam comprando também acharam... e ao chegar uma terceira garota, que também achou um absurdo aquele preço, resolvemos “dividir” uma corrida de táxi.  Pagamos R$ 60,00 para irmos até o Aeroporto.   No caminho conversamos e vim a saber que as duas que estavam comprando as passagens juntas (Núbia e Luciana), eram de Rio Claro – cidade vizinha de Araras – já a outra garota era de Blumenau (Sandra).

Descobri, mais tarde, que há ônibus do terminal para Guarulhos de 30 em 30 minutos e não precisaria ter chegado tão cedo em São Paulo, pois meu voo sairia apenas às 7 h da manhã do dia seguinte.

São 23 horas, teria que esperar mais 8 horas, e pensei em usar a internet.    Fui até a sala da Telefônica, que fica dentro do Aeroporto, pasmem... R$ 20,00 a hora!   Fui ver TV.

03/10/2006     
O voo de São Paulo estava previsto para sair às 7h 35 min... saiu às 11 h.
Ao chegar à Argentina (escala), mais uma surpresa... o voo que partiria às 14h 20min de Buenos Aires para Madri “foi pelos Aires”, só sairia de lá às 21 h.

04/10/2006
Cheguei em Madri às 14 h – horário local – 9 horas no meu relógio.

Observação: Durante o voo Argentina/Espanha, conheci o Dr. Cláudio Staim e sua esposa Vera, estavam indo para Paris.    Ela é professora/supervisora em Porto Alegre e ele é aposentado.
Ele começou a contar um resumo das histórias da sua vida, que tinha se casado aos 38 anos (minha idade), falou sobre seus filhos, sua neta e outras coisas mais.  Por fim, quando me dei conta, também estava lhe contanto um resumo da minha história... foi muito bom conhece-los.    O Dr. Cláudio começou a dizer que “havia encontrado um novo filho” e me deu seu endereço em Porto Alegre, disse que gostaria muito que eu fosse visitá-los algum dia.   A viagem foi muito agradável... um presságio do que ainda estava por vir.
           
Na Argentina, enquanto aguardava o horário do voo, conheci o Márcio – ele que estava indo estudar  em Santiago de Compostela - até peguei o endereço de onde ele ficaria, marcamos de "tomar umas" quando eu estivesse por lá, mas isso nunca aconteceu... 

Ao desembarcar em Madri, me despedi do Dr. Cláudio e da  Vera.   Eu ficaria ali, enquanto eles iriam fazer a conexão para Paris.     Minutos mais tarde, quando eu já estava no saguão do aeroporto, avistei os dois “meio que perdidos” do lado de dentro, perguntei o que estavam fazendo ali, já que deveriam estar fazendo a conexão – já estavam chamando os passageiros pelo sistema de som – e ele me disse que “ninguém entendia o que ele perguntava e que não sabia para onde ir”.   Eu pedi autorização para a fiscalização e me deixaram retornar para a parte interna (até estranhei o fato, pois não é comum permitirem que se retorne), mostrei a eles onde deveriam ir, ele me deu um sorriso e disse “eu não falei, parece um filho cuidando da gente”. Mal sabiam eles que, as histórias que me contaram sobre suas vidas, me fizeram repensar a minha... eles foram como “pais” para mim!

No aeroporto de Madri, peguei o ônibus número 200 que é o que vai para a Av. América, onde fica o Terminal (1 euro).   Ao chegar ao terminal, comprei uma passagem de ônibus para Pamplona (24,56 euros).

Resolvi comer alguma coisa, comprei um croissant e uma xícara de café com leite ( 2 euros ).  Resolvi sair da estação e dar uma “caminhada”, encontrei um supermercado “Euroski”, achei tudo muito barato. Comprei 1 caixa com 4 sorvetes “cornetos”, 1 litro de suco de laranja, 4 iogurtes, 9 embalagens de 200 ml de suco para viagem, 1 pacote de madalenas, 1 pacote de bolacha, 8 lanches para viagem... tudo por 6,60 euros.

De volta para o terminal... o ônibus só sairia às 18h e 30 min.

E foi o que aconteceu, 18 h e 30 min, parti em direção a Pamplona.

Cheguei em Pamplona às 23 h.    Uma pousada que fica em frente da estação custa 33 euros (para 1 pessoa) ou 40 euros (para 2).    Como a estação fica fechada até as 6 h da manhã, há várias pessoas do lado de fora aguardando o ônibus que virá.  Esses ônibus não entram na estação, as pessoas descem – ou sobem – na rua mesmo.




Fiquei até 1 hora da manhã “conversando” com um equatoriano que estava aguardando o ônibus para Barcelona.   Outras pessoas se aproximaram, mas estava difícil a comunicação, já que um dos que se aproximaram só falava francês e outros dois só falavam em Croata.

      
05/10/2006     
São 6 da manhã, surpresa! a estação não está aberta... chove e faz bastante frio.

Passei mais de 1 hora conversando com uma espanhola que também estava esperando que a estação abrisse.    Ela é proprietária de um bar em uma cidade próxima de Pamplona ( não me lembro o nome ), e disse que estava indo visitar os pais...  ela também estava muito preocupada com o cabelo, ficava explicando o tempo todo que a chuva o havia desarrumado.    O meu tinha quase 3 dias que não via água... por isso também estava uma coisa!

A estação só abriu às 7 horas e - surpresa! - não existe ônibus direto para Saint Jean (na França), só para Roncesvalles, que sairia às 18h... teria que aguardar o dia todo!

Não me sentia bem neste dia, estava com febre, e resolvi ir até uma igreja que tinha visto quando caminhava durante a madrugada.    A igreja era linda, encontrei o albergue dos Peregrinos, fica no “centro” de Pamplona... foi pura sorte!

Encontrei alguns peregrinos que estavam chegando de Roncesvalles, estavam todos cansados, molhados e bem sujos.      Disseram que na parte do caminho que é feito dentro de uma floresta eles pegaram muita chuva e que foi difícil o trajeto.

Comentários:
1- Aquele "imbecil" que escreveu o artigo dizendo que fez o caminho, mentiu!   Nunca existiu ônibus direto de Pamplona para Saint Jean, e um táxi para lá custa 60 euros; já o ônibus para Roncesvalles custa menos que 5 euros.
2- Não entendo as razões que levam a maioria dos Peregrinos a pagarem o táxi, pois de Roncesvalles para Saint Jean é, praticamente, só descida... e para quem está disposto a andar quase 1000 km a pé, qual o problema em começar a fazer isso em Roncesvalles?



Aqui é o início mais comum da "jornada", St. Jean Pied de Port/França
(Essas fotos de St. Jean e Roncesvalles eu tirei em 2010)


 ainda em St. Jean
 A caminho de Roncesvalles





 Esse é o Albergue em Roncesvalles

De Roncesvalles até Pamplona são 43 km... o ideal é parar antes.

De volta ao caminho-2006
Pamplona:
No albergue, conheci duas senhoras francesas, Josie e Brigite, elas estão no caminho faz tempo, pois estão fazendo uma rota diferente da “tradicional”.   Elas estão fazendo um caminho que corta toda a França e depois toda a Espanha... a maioria faz a rota que se inicia em Saint Jean Pied de Port (território Francês), e vai até Santiago de Compostela... conversamos um pouco e dei a cada uma delas uma barra de chocolate brasileiro.

Existem vários caminhos para se chegar a Santiago de Compostela
O mais conhecido é o Caminho Francês, aquele feito pelo Paulo Coelho e por mim.


Albergue em Pamplona - Josie e Brigite
Atualmente esse albergue não existe mais, construíram outro - próximo - muito mais bonito... e bem maior! 

06/10/2006
Acordei às 5h e 30 min, já tinha peregrinos saindo, mas a maioria estava dormindo.    Tomei uma bela ducha, café reforçado e comecei a jornada.

Resolvi fazer o caminho sozinho e estava no meio da cidade quando uma garota – que eu já tinha visto no albergue – passou rapidamente por mim, sorriu e disse: “olá, buem camino”.   Ela andava rápido com aquela mochila, resolvi segui-la, afinal, ela tinha um “guia” nas mãos.    Depois de uns 5 minutos de caminhada ela parou bem no meio de uma praça e começou a olhar para os lados, parecia perdida, e eu soltei um “Please, don't get lost...i'm following you”... ela começou a rir e disse: “This is the way”.    Ela se chama Tanja ( se pronuncia Tânia ), e é da Suíça.   Por fim, caminhamos juntos o dia todo.

Monumento ao peregrino, situado no "Alto de El Perdón"

"Ultreia" é a maneira mais usada para as saudações entre peregrinos... todos dizem, mesmo sem saber ao certo o seu significado.   Ultreia quer dizer: "Vá em frente", "vá adiante".    A palavra aparece na frase: "Ultre ia Et Sus eia! Deus adjuva nos!", uma saudação Jacobeia.



As francesas (Josie e a Brigite), caminhavam num ritmo muito forte, pareciam duas jovens... deixavam muitos "deles" para trás.

Chegamos no Albergue Reparadores, em Puente La Renha, às 15 h.   Josie e Brigite, as duas francesas, chegaram pouco depois.  Eu fui fotografar alguns lugares, quando voltei... capotei!
A Josie me deu seu endereço na França, fica em Verhamme.



Essa é a famosa ponte onde, dizem, os dois mundos se encontram: físico e espiritual.
Puente la reina



Curiosidade:
O padre, em Pamplona, me disse: “ Saint Jean, Roncesvalles,..., são nomes... não importam.  Siga em frente, pois Tiago te espera, o caminho te espera, muitas pessoas te esperam... caminhe!”

07/10/2010
Sai de Puente de La Renha às 7h 30min, resolvi caminhar sozinho.
De Puente  La Reina até Estella – próxima parada – seriam aproximadamente 22 km, com muita subida.    Minha mochila estava muito pesada, com o dobro do peso recomendado – tinha mais coisas que o necessário, pois iria ficar mais um bom tempo andando pela Europa, depois que terminasse o caminho – mas como eu me considerava “o cara”, achava que daria conta do recado... tolice!

Na metade do caminho havia um cruzamento muito mal sinalizado, fiquei na dúvida com relação ao caminho a seguir.    Comecei a procurar alguma sinalização – sempre existe alguma – e encontrei uma seta pintada em uma pedra que a mata estava escondendo, foi o único local – até agora – no qual a sinalização  estava difícil de ser vista.
Como perdi algum tempo naquele lugar, outro peregrino se aproximou e como ele também não tinha conseguido enxergar a seta, perguntou-me se estava certo do caminho a seguir.    Mostrei-lhe a seta na pedra, e seguimos o caminho.    Seu nome é Jairo (pronuncia-se Rairo, um colombiano).  Fizemos o restante do caminho conversando.   Em determinado momento ele perguntou se eu havia “treinado” para o caminho, pois ele havia treinado nos Andes.   Lembro de ter pensado: “grande coisa, eu treinei no Judith (escola onde trabalhava), subindo e descendo escadas”.

O caminho é realmente surpreendente.  Há muitas árvores frutíferas, comi uvas, figos, peras, maçãs... essa época do ano tinha muitas frutas (mês de Outubro).

Embora digam que não se deve comer essas frutas, a verdade é que conversei com alguns produtores e eles me disseram que nem colhem as que ficam ao lado do caminho, pois já esperam que os peregrinos as peguem... alguns disseram "Santiago nos dará em dobro"... mas há os que até colocam cercas elétricas em suas plantações.

Eu, pegando maçãs... reparem que a árvore fica do lado de fora da cerca... não estava invadindo nada... e o chão estava repleto de frutas que caíram... "oferta maior que a procura"

Passei por um local onde uma canadense faleceu, há um certo “silêncio” diferente... algum tipo de respeito, sei lá... algo diferente!   Rezei um pouco e segui meu caminho.

Hoje apareceu o primeiro ferimento no meu pé, espero que não piore.

Cheguei em Estella às 12h e 30min, fui o primeiro e tive que aguardar até às 13 h (quando o Albergue é aberto).    Foram 5 horas, “sem paradas”, minhas pernas doíam muito, mal conseguia subir as escadas até o primeiro andar... tinha que dar um jeito no peso da minha mochila!





Vista da cidade de Estella
Recepção no Albergue

Tomei banho e dormi até às 17h, quando acordei fui ao mercado.  Gastei 6,88 (euros), estou aprendendo a economizar, tem sobrado muita comida.     Estou comendo muito, desse jeito vou terminar o caminho de Santiago e tomar o caminho do Spa.

Amanhã passarei num lugar onde se toma vinho na fonte, FUENTE DE IRACHE, não via a hora... seriam 22km de caminhada... e a dor tinha passado, estava pronto para o novo dia!

Os peregrinos são convidados a "brindar pela felicidade", e podem tomar o vinho grátis... mas só no local.
Você pode comprar - para levar - o vinho produzido aqui.

           
08/10/2006
Sai às 7h e 50min de Estella e cheguei às 12h e 20 min no albergue em Los Arcos.   Fui, novamente, o primeiro a chegar.    


O albergue custou 4 euros e é bem melhor que o último, que também custou 4 euros.   Neste, as duchas são separadas, mulheres de um lado e homens do outro.


Tomei um belo banho, lavei minhas roupas e resolvi não dormir como no dia anterior, pois acordei às 3 h da manhã... não estou acostumado a dormir no período da tarde.

Perguntei se havia algum supermercado por perto e me disseram que aos domingos, praticamente nada estaria aberto... mas eu resolvi arriscar e encontrei uma “panadaria” aberta.    A mulher que me atendeu era muito mal-educada, perguntou o que eu queria, mas como eu demorei um pouco para responder ela logo disse: “diga logo o que você quer, eu tenho muita coisa para fazer”... com tanta educação, pedi só o leite e uma “tortilha”.   Uma francesa, que eu já tinha encontrado no último albergue, entrou quando eu saia, segundos depois ela saiu gritando... quando eu olhei para trás ela dizia “maluca”, “stupid”, “crazy”,... eu concordei com ela e disse que já estava alojado no albergue que ficava ali perto e que estava indo para lá, ela retornou comigo e acabou ficando por lá também.
A caminhada de hoje foi puxada, mas estou preocupado com a de amanhã, serão 28 km, a maior distância até agora.   

Fui para a cozinha e o responsável pelo albergue disse que havia arroz se eu quisesse... não deu outra, fiz arroz!   Tinha alguns capeletes na geladeira, desses que vendem por aqui também, adivinhem... eu comi tudo!
Eu e a francesa 
A francesa – aquela da panadaria – também fez arroz ( só que de frigideira ), ela fez com que eu provasse... gostoso! É diferente do que estamos acostumados, você coloca o sal no prato.    O engraçado é que ela não fala inglês nem espanhol e eu não falo francês... a comunicação foi difícil, mas faz parte do caminho.

Chegou um senhor brasileiro, Eduardo, que é de Peruíbe.     Ele trouxe vinho e também me emprestou o adaptador para que eu carregasse as pilhas da câmara fotográfica, já que as tomadas não eram iguais às do Brasil.

Haverá uma missa às 19h, é uma missa especial para peregrinos.

Torre da Igreja de Santa Maria de Los Arcos
           
Acabo de chegar da igreja de Los Arcos... incrível!    O padre abençoa os peregrinos, um a um, emocionante!    Ele pediu para que ao chegarmos em Santiago fizéssemos uma oração pelos pobre e necessitados, pelas mulheres desatendidas e abandonadas... e por ele também.
Ao fundo, com cara de bravo, o Eduardo.
Noite no albergue... momento para se colocar no papel os acontecimentos do dia

09/10/2006
Sai de Los Arcos às 7h, caminhei no escuro por quase 1 h e 15 min, não recomendo!    Quase me perdi, não era possível enxergar todas as “marcas” quando se deixa a cidade.    Sorte minha que os que estavam atrás tinham lanternas – outro erro meu, que não tinha – e gritaram avisando que eu tinha passado a entrada... foi sorte!
Indicação do Caminho
Indicação do "Caminho errado"



Um polonês, Robert, que estava se recuperando de uma cirurgia, ficou bem para trás... fiquei preocupado com ele fosse passar reto pela entrada e pedi a lanterna emprestada para fazer alguns sinais... ele entendeu, pois quando o dia clareou pudemos vê-lo ao longe.
Foi o caminho mais longo até agora, minha perna esquerda está muito dolorida, resolvi pesar minha mochila, pois todos diziam que ela estava muito pesada – como se eu não soubesse – surpresa: 18 kg, três vezes o que a maioria estava carregando.   Lembrando que o ideal é carregar 10% do seu peso... eu não peso 180kg... ainda bem!
Albergue em Logronõ
Todos estavam enchendo o meu “ego”, dizendo que eu não era professor coisa nenhuma, mas sim preparador físico.      Brincadeiras a parte, fiquei sabendo que poderia enviar parte das coisas, pelo correio, para Santiago e que eu teria 30 dias para retirá-las... despachei 5,5 kg, agora passaria a carregar “apenas” 12,5 kg.    Ainda não era o ideal, mas se eu estava sendo o primeiro a chegar, mesmo com 18 kg, agora ninguém me segurava.
Um espanhol que estava fazendo o caminho junto com o seu filho começou a fazer brincadeiras comigo na hora do jantar, ele dizia “a polícia está procurando um brasileiro que passou em alta velocidade”.    Ele fez outra “piadinha” sobre o Brasil, mas não tem graça quando escrita, teriam que ver a “performance” que ele fez.




Comi lasanha, canelone e suflê de chocolate, gastei 6,26 euros (o vinho ajudava a relaxar, era quase indispensável e custavam na faixa de 1 euro - os vinhos "locais").    O albergue custou 4 euros e a internet era voluntária, mas só poderia ser usada por 15 minutos.

Amanhã deverá ser pior que hoje, serão mais de 30 km... espero que minha perna esteja melhor... eu não sou o Clark Kent!

10/10/2006
Sai de Logronõ às 7h e cheguei em Najera às 14h, foi a etapa mais difícil até agora.    Desde a saída, estava sentindo muita dor na perna esquerda, ela estava muito inchada, pensei que fosse ter que ficar em Navarra – metade do caminho – cada vez que minha perna tocava o chão era como se uma agulha atravessasse o pé.    Procurei atendimento durante a tarde e pediram para que eu repousasse e tomasse anti-inflamatório (mas eu já estava tomando).

O albergue é muito bom, porém só tem duas duchas para quase 30 peregrinos.  Eu paguei 4 euros, que é contribuição voluntária, e gastei 5,58 euros no mercado (1 litro de sorvete napolitano, feijão com carne, pão, leite, suco de abacaxi, queijo fatiado, iogurte e 3 bananas).

Albergue em Najera



Albergue em Najera

Espero conseguir caminhar amanhã, pois não quero parar.

Hoje eu acessei a internet e vi alguns recados no orkut... me dão forças para aguentar essa dor.

11/10/2006
Sai de Najera às 7h e cheguei em Santo Domingo de La Calzada às 11h e 30min.    A perna continuava bem inchada... e a direita começava a doer.
Estou tomando anti-inflamatório, 4 x por dia, a dor chegava a ser insuportável em alguns momentos.
Hoje eu comprei macarrão, molho, leite, suco, presunto, cappuccino, mousse de chocolate e gastei 5,02 euros.     Acabo de fazer um macarrão super simples, só que  o cheiro chamou a atenção.   O Tiago – brasileiro de Porto Alegre, que conheci aqui – e o Eduardo, lamberam o beiço.

Atualmente, esse albergue foi todo reformado... ficou parecendo um hotel 3 estrelas!
A cozinha, agora, é toda moderna... em nada lembrando essa da foto!


                                 “Amigo é uma única alma habitando dois corpos”   Aristóteles

Aqui na Espanha até os cães fazem a "ciesta" durante a tarde


Sai para comprar um pão e comprei também um agasalho para chuva (6,38 euros).
Precisava resolver o problema da minha mochila – outro erro, ela não tinha capa para chuva – e estava improvisando um saco plástico.

Irei, daqui a pouco, assistir à missa na igreja de Santo Domingo, dizem que - às vezes -o “galo canta”, tem que ter sorte.

Na primeira etapa de hoje choveu muito, quase não tirei foto... espero que amanhã o tempo esteja melhor, assim como minha perna...

Ninguém tinha ideia da dor que estava sentindo.   Quem me via chegando – como hoje – de duas a três horas antes de todo mundo, não imaginava o sacrifício que tinha sido... a dor era de chorar!

12/10/2006
“Bicha”, em Polonês é “obonhaque”... coisas que se aprende no caminho (cultura inútil! Foi o Robert quem ensinou).
           
Sai às 7h da manhã e segui em direção a Belorado, onde cheguei às13 h.    Desta vez não fui o primeiro a chegar, o Colombiano chegou na frente, ele não quis para para fotografar alguns lugares e isto faz muita diferença.   Como não estou preocupado com o tempo de caminhada, prefiro registrar as imagens dos lugares por onde passo, já que muitas vezes o “tempo” não permite que se tire boas fotos.     Hoje, por exemplo, choveu mais da metade do tempo, por isso alguns lugares não foram fotografados.

           
Pensamento do dia: quem viaja nessa época deveria comprar uma câmera sub-aquática...kkk
         
O Albergue é “voluntário” (normalmente se dava 4 euros, isso em 2006), foi construído em 1705, mas as acomodações são muito boas.    Foi a melhor cama até agora!  Falando em albergue, no caminho passei pelo albergue do brasileiro Acácio, é “simples” por fora, mas super aconchegante por dentro.    Quem vê o exterior e não entra para conhecer, pode até sair com uma má impressão, mas quem entra se encanta com a cordialidade desse “cara”... super atencioso, paciente, explica as coisas com a maior boa vontade... valeu a pena conhecer!
Eduardo e Acácio


Hoje é feriado “ Dia da Espanidade”, é feriado festivo em toda a Espanha.   Foi o dia em que Colombo foi à América pela primeira vez.

No albergue, estou deitado ao lado de uma norte americana, da cidade de Ohio, se chama Michelle e está fazendo o caminho junto com seus pais (este era o seu primeiro dia “sozinha”, pois eles haviam decidido se separar um pouco), conversamos uns 10 min... ela é muito bacana e nos comunicamos muito bem.    Os pais dela já fizeram o caminho 2 vezes.  Não perguntei – ainda – a sua idade, mas ela é muito jovem, se tivesse que adivinhar diria que tem uns 17 anos.

Da esquerda para a direita: David e Sérgio (Pai e filho - from Spain) Dan e Tiago (from Brasil), Robert (from Poland), Jairo (From Colombia) e Eduardo (Brasil)





Minha perna esquerda está bem melhor.     

Em Santo Domingo de La Calzada, constatei algo muito triste, a igreja principal da cidade cobra 2 euros para visitação (assistir a missa é grátis, mas só no horário da missa), ou seja, em breve as igrejas virarão museus... só se sustentarão dessa forma!


Hoje o dia está muito frio, o mais frio até aqui.    Foi bom ter chegado cedo no Albergue, pois começou a chover forte.   Estamos preocupados com a alimentação, pois não temos nada para comer e é feriado.

Consegui um pacote de macarrão no Albergue, alguém deixou para trás.   Como não tinha molho, nem óleo, fiz macarrão margarina-e-alho, pois era o que tinha.    Também cozinhei duas batatas, mas o bom mesmo veio depois, a moça que mora no albergue nos ofereceu um prato de salada e vinho... lógico que eu aceitei!    Depois ela veio com pães, muitos pães... que também não recusamos... a alimentação foi ótima!

Saímos para assistir à missa (eu, Tiago e o Eduardo), foi bem diferente, o padre disse algumas coisas interessantes e eu traduzi, algumas colocações que ele fez, para duas irlandesas (mãe e filha), que responsa!

A imagem da virgem que está na Catedral data de 1500... muito linda!
Minha câmera estava com a data/hora errada, só aprendi a regular agora... estava com duas horas de diferença (para mais).

13/10/2006
Sai de Belorado às 7h e 30 min (iria tomar café no albergue – 2 euros – mas só começam a servir às 8 h), passamos por lugares incríveis, uma igreja com várias tumbas, em San Juan de Ortega, séculos XI e XII.   O lugar não tem nada além de um bar, mas o interior da igreja é fantástico!


A garota americana chegou quando estava descansando.    Ela disse que já tirou 2000 fotos em 22 dias (um ritmo bem lendo de caminhada), pois faz fotografia em Ohio e está preparando  material para um trabalho.    Ela ficaria em Ages, passaríamos por lá, mas fomos até Atapuerca... não sei se foi uma boa troca!

Chegamos em Atapuerca bem cansados (os três patetas: Dan, Tiago e Eduardo), estou com um estiramento da perna direita, mas as dores estão bem mais leves.

O jantar foi macarrão com salsicha Frankfurt (750 g)... não dava para emagrecer!

O albergue é bacana, são quartos para seis pessoas, e o preço foi o mais caro até agora (7 euros e sem café da manhã).

Gastei no mercado 9,25 euros: leite, queijo,  pão, banana, macarrão, molho e salsicha.

As fotos estão saindo com a data erra, só me dei conta agora... que droga!

Amanhã iremos a Burgos... dizem que é uma cidade muito grande – se comparada com as que estamos passando – e muito bonita também.

Até aqui já foram, + ou -, 250 km de caminhada.   Hoje não choveu, mas estava muito frio... a noite parece que será um gelo.

Estou com saudade de muita gente, já não sou o mesmo cara que saiu de casa aos 21 anos e morou por 2 anos em Londres... e, certamente, não sou o mesmo cara que começou o caminho... você muda.

14/10/2006
Sai de Atapuerca às 7 h, estava um frio de “lascar”, cheguei a Burgos às 12 h e 30 min; horário de chegada no Albergue, pois entrei na cidade 1 h antes, é antes, é que o albergue ficava na praça, próxima ao centro (o endereço atual mudou, o albergue fica agora bem no centro, ao lado da Catedral).
Estou com muita dor na virilha e as duas pernas estão doendo muito, especialmente a direita.
Burgos


       
Estávamos com muita fome, mas o albergue estava fechado... fomos os primeiros a chegar (eu e o Tiago).
O albergue abriu às 14 h, tomei um banho e sai para tentar entrar em contato com o Brasil (via internet), também salvei as fotos num CD.
O Eduardo tomou um caminho diferente – isso, na entrada de Burgos – achávamos que iríamos encontrá-lo metros à frente, mas o “perdemos”... espero que ele esteja bem.
          
O albergue custou 3 euros, são muitas pessoas num mesmo lugar, é o pior até aqui (hoje, essa realidade mudou, o albergue está numa localização melhor e com acomodações melhores, mas eu indico o albergue da igreja, fica um pouco “fora de mão”, mas é muito mais “O Caminho”).


Fui ao mercado, gastei 8,90 euros, comprei: 2 potes com 500 g de iogurte, 1 pão, salame e queijo, 1 coca cola, salame, macarrão, salame extra, 2 embalagens de molho de tomate, 1 salgado e 1 lata de refrigerante.

Acessei a internet e deixei alguns recados.
Na cidade, fui à Catedral... meu Deus, que coisa maravilhosa!... incrível!... imensa!... fabulosa!... só vendo!

É a cidade com a maior concentração de pessoas bonitas que eu já vi.


            Tenho vivido com mentiras que me foram apresentadas como verdades
            Em muitas dessas mentiras só acreditei porque tornavam a vida mais “fácil”

            Eu acreditei em mentiras nas quais quis acreditar
            Mentiras que me fizeram mentir
            Mentiras que ofuscaram as verdades
            Mentiras que me afastaram de mim
            Mentiras que me afastaram de outros
            Mentiras que me afastaram de Deus
           LRDantas

15/10/2006
Domingo, sai de Burgos às 7h e 20 min e cheguei em Hontanas às 14 h.    Foram 30,9 km... foi o meu melhor dia no caminho, pois andei essa distância sem sentir dor... embora a perna esquerda ainda esteja inchada, a dor praticamente sumiu.



O albergue que estou é muito pequeno e ainda não sei se haverá missa à noite... também vou ligar para o Brasil (1a. vez).
Acreditem, a cidade tem 77 habitantes... tem mais casas do que pessoas.

Os três patetas... Dan (eu), Sérgio (El Roncador) e Tiago



O Eduardo não esgota as suas frases celebres:
“Todas as águas sujas se encontram no mesmo lugar”
“O Lula deveria se chamar Baiacu... você come e morre!”.

Poema de Peruíbe – by Eduardo (Du-helou):
“Peruíbe terra nojenta
Quando não chove, venta
Quando faz calor ninguém aguenta...
Eta terra lazarenta!”                  
(Logicamente essa era só uma brincadeira, pois o Eduardo sempre dizia que amava aquele lugar)

“Eta peso de los cassete”

“Passarinho que come pedra, sabe o cu que tem!”

16/10/2006
            Um sonho poderá virar realidade,
            desde que você acredite que ele não é “apenas um sonho”!           
LR Dantas
O Caminho é religioso e místico... por isso é muito comum encontrarmos esse tipo de coisa.
Para quem leu o livro do Paulo Coelho, Diário de um Mago, dá para ter uma ideia do que estou falando





            Amigo não é aquele que está ao teu lado quando você precisa,
            mas, sim, aquele que senti na alma
            por não ter estado ao teu lado quando você precisou.               
LR  Dantas

Sai de Hontanas às 7 h e cheguei em Fromista às 15 h.   Percorri quase todo o caminho sozinho, foi muito bom.



O albergue custou 5 euros e não tem cozinha, gastei 7 euros no mercado, comprei: 1 litro de achocolatado, 1 lata de salada em conserva, 2 salsichas, 2 bananas, 4 mousse, 1 pacote de bolo, 1 pacote de croissant, 1 barra de chocolate e 1 litro de suco de laranja.

Conhecemos uma garota do Canada, ela está machucada e talvez tenha que parar por 2 dias.

Hoje foi um dia especial, aconteceram coisas incríveis no caminho, desde “puxões” na mochila, até pessoas que me acompanharam... fora os “insights”.



            Diferentes regiões
            Diferentes cidades
            Diferentes culturas

            Cada dia um lugar
            Centenas de rostos sem nomes
            Centenas de vozes desconhecidas

            É engraçado como se sente falta daquele “oi” familiar
            Aquele “oi” que se ouvi todos os dias e que nem se dá valor

            Caminho sozinho e no entanto não me sinto só
            Tenho tantas lembranças boas em mim
            Trago tantas pessoas comigo... impossível me sentir só!

            Ouço gargalhadas amigas em minha mente
            Ouço vozes dentro e fora de mim
            Vozes que me fazem ver erros que antes não via...
                                                                      Vozes amigas                                                             
             LR Dantas


17/10/2006
Sai de Fromista às 7h e 30 min, chovia e fazia frio, cheguei em Carrion de Los Condes às 11h e 30 min.

Fiquei no Monastério de Santa Clara, um quarto com 3 camas, tudo parece muito bom, foram 6 euros, mas tem cozinha!


O almoço foi arroz, hambúrguer, purê de batata... e no jantar, comemos macarrão, linguiça picante, hambúrguer e vinho; sobremesa: musse de chocolate.

Gastos: almoço + jantar + sobremesa, 5,45 euros.

Usei a internet na Biblioteca Municipal – é dica para quem não quer pagar nada – por quase 3 horas (se não tem ninguém para usar, eles te deixam à vontade).   Ao lado há um supermercado “Lupa”, com preços razoáveis.

Ao chegar no Albergue, surpresa: tem ratos!   Reviramos o quarto todo... nada.    São 22 h e 45 min, com o ronco do Eduardo, certamente o rato não virá aqui.

O jantar foi ótimo, a Clarice (Francesa), jantou com seu amigo, mas conversamos bastante.
A Lola está aqui ( a garota espanhola, de Valência, que conhecemos em Hontanas e que viaja com o seu namorado e um outro amigo), demos muitas risadas.


O Eduardo dorme “resmungando”:  “rato de monastério... Porra! Rato de 500 anos!”

Dormirei rezando para que amanhã não esteja chovendo.

O Eduardo deu “chilique” durante a noite, acordou todos no albergue... vários peregrinos vieram reclamar comigo e com o Tiago... ficamos sem ter o que falar.

18/10/2006
Sai de Carrion de Los Condes às 8h e 30 min e cheguei em Sahagun às 15h e 45 min, foram mais de 40 km, quase sem paradas.       O Eduardo ficou para trás, acho que ele estava se sentindo mal pelo episódio da noite anterior.
 O Eduardo parou para "descansar"... quis ficar sozinho, foi o que pensamos.

Na saída da cidade encontramos a Clarice, como sempre, muito simpática.   Nos despedimos e dissemos que nos veríamos em Compostela ( ela iria fazer o percurso “normal”, já eu e o Tiago iriamos fazer um percurso de 42 km.

Choveu forte na parte da tarde e ventou muito também.    Certo momento me abriguei em baixo de uma ponte.

 Está virando "moda" albergue com piscina, esse não é o único... mas não ficamos aqui!

O albergue custou 4 euros e gastei outros 4,14 com comida e 2,11 com remédio (anti inflamatório).
Comemos macarrão com queijo, musse de chocolate, madalena, chocolate e suco de maçã.  Para o café da manhã, comprei leite , pão e margarina.      Comprei uma capa de chuva maior, gastei 4 euros, chama “poncho”.

19/10/2006
Sai de Sahagum às 8h e 30 min, o dia foi “difícil”, cheguei em Mancillas de Las Mulas às 17h.       Foram 36,7 km de caminhada, com muito vento, muito vento mesmo!

No caminho, passei em Deliegos – lugar “macabro” - não havia ninguém na recepção do albergue, pior, ninguém na cidade, um silêncio assustador – a única coisa visível era a fumaça que sai dos “buracos” que existiam nas encostas... cai fora de lá rapidinho!

Ao chegar em Mancillas, uma surpresa agradável, a Francesa, Josie, que encontrei em Pamplona estava no mesmo albergue.   Ela veio me cumprimentar e apresentou um senhor – amigo dela – para quem ela havia falado sobre mim.    Ela disse: “esse é o rapaz do Brasil, Dantas”  (eu fiquei surpreso por ela se lembrar do meu nome), “aquele que me deu chocolate”... fiquei feliz com tudo, perguntei sobre a Brigite, e me disseram que ela estava descansando.

O senhor que nos recepcionou é “o cara”, seu nome é “El Lobo”, ele fez uma “energização” na minha perna, foram uns 30 minutos... as dores sumiram!
Só quem viu acredita... a "energização" feita pelo "El Lobo", desinchou a minha perna... incrível!


“El Lobo” está aqui já faz 9 anos, ele é Alemão.   Há um fax do Paulo Coelho, na parede do albergue, cumprimentando e agradecendo pela hospitalidade dada a ele quando passou por ali.

O jantar foi “sinistro”, tinha um britânica que ficou “assustada” com a quantidade de macarrão que fiz só para 2 pessoas (eramos só eu e o Tiago), acabamos por deixar – contra a vontade – uma boa quantidade de macarrão.     Quando ela voltou e viu a panela pela metade disse: “eu sabia, não conseguiriam comer tudo”, mal sabe ela que foi “por vergonha”.    Mas, não jogamos nada fora, a Josie e seus amigos comeram o que havia sobrado.

O dia foi bem cansativo, mas terminamos super bem... amanhã iremos para Leon.

20/10/2006
Sai de Mancillos de Las Mulas às 8 h e cheguei em Leon ao meio dia.   Tive que esperar uns 30 minutos até que o albergue abrisse.
Será o carro pequeno ou serei eu muito grande? rsrsrsrs

O albergue é muito bom (3 euros), a Lola estava aqui, ela veio de trem, pois disse estar cansada.
A internet é grátis, usei um monte.

Algumas pessoas olham o lado de fora do prédio onde fica esse albergue e nem entram... acabam indo para outros lugares... perdem a oportunidade de ficar num lugar muito bom, com um pessoal que trabalha na recepção que é nota dez!


A cidade é muito bonita, a Catedral é imensa!  Assisti à missa, Latim, canto gregoriano, lágrimas, órgão,..., não faltou nada!







Fui numa loja “China”, muita roupa bonita e barata, pena que não possa comprar nada agora... seria mais um peso para carregar!

Ao chegar no albergue encontrei o Eduardo, ele também estava lá, mas em quarto diferente.
Fiquei em um quarto para 8 pessoas, mas estávamos em 3 (eu, Tiago e o Jairo).

O jantar foi: lasanha, sopa de grão de bico, suco de laranja... comidinha "leve", pois no lanche da tarde já tinha devorado uma mini-pizza e suco de morango e míni-pizza.   Gasto do dia, incluindo o albergue, 10 euros.

21/10/2006
Sai de Leon às 8h e 45min, o Jairo acompanhou à distância, como não haviam “setas” indicando o caminho, resolvi caminhar mesmo sem vê-las ( não recomendo ), o Jairo começou a dizer “esse não é o caminho”, me irritei!  Disse a ele que voltasse, fizesse o que ele achava ser o certo... logo depois as “setas” apareceram.
Como havia uma bifurcação, com 2 caminhos a se seguir, ele foi para um lado e a maioria também, já eu segui minha intuição (motivo da intuição: Viladangos: “dan go”... eu fui!).  O caminho que escolhi era quase 6 km menor, tanto que cheguei em Hospital de Órbigo às 16 h e não havia ninguém (apenas um senhor americano, Phil, que se parecia com o Papai Noel.   O albergue custou 4 euros, é paroquial – o Municipal estava fechado – e muito “sinistro”, construção super antiga... acho que tem aranhas do século XIV por aqui, mas o banho foi quente e vai dar para dormir legal (espero).

Alguém dormiria bem depois de ver uma dessas no banheiro?


 Essa senhora é da Alemanha, mas não me lembro seu nome... só sei que ela caminha muito bem.
Embora não tenha perguntado a sua idade, ela deve ter uns 65 anos... e caminha sozinha
Ponte de acesso a Órbigo... o local era "palco" daquelas disputas entre cavaleiros

Jantei o famoso macarrão com chouriço, gastei 2,75 euros... e 1,30 com um salgado.

Assisti à missa na igreja que fica ao lado do albergue, essas missas são curtas, mas faz muito bem, tem sempre um “canto que encanta”!

Tomei um café com leite quentinho agora a pouco, são 22h, e vou dormir preocupado com as bolhas que apareceram no pé esquerdo, tomara que não piorem.

            A dor existe,
            A fome existe,
            As lágrimas existem ( e insistem ).

            A saudade,
            As lembranças,
            Mas há também a certeza.
            É, a certeza!

            Certeza de que “coisas” mudarão,
            Que eu mudarei,
            Que meus valores mudarão.

            E as pessoas que amo?
            Isso só mudará uma coisa,
            A certeza de que as amo, mais do que imaginava!
          LRDantas

22/10/2006
De manhã a mulher que toma conta do albergue “regulou” o açúcar, pois eu não havia pago para tomar o café (2 euros), mas eu tinha o que comer, só queria açúcar para adoçar o Nescafé... esse tipo de comportamento não condiz com “O Caminho”!

Sai de Órbigo às 8h e cheguei em Rabanal Camino às 17 h, só parei um pouco em Astorga para conhecer a igreja e o castelo de Gaudi... fenomenal!



O albergue é de um casal de ingleses, muito atenciosos.   Ela estava super preocupada com o meu pé, até me ajudou fornecendo alguns medicamentos... ah, pegamos as últimas vagas (eu e o Tiago).

         
Forçamos muito hoje, não farei mais isso (mentira, fizemos muito pior depois), meu pé direito está com umas bolhas do tamanho dos dedos.

A igreja em Astorga e, especialmente, o castelo de Gaudi são indescritíveis.

Hoje, o rango foi “free”... macarrão alho/óleo, que até ficou bom... e como o albergue era de um casal da Inglaterra, não poderia faltar o chá... tomei 3 xícaras... ainda tomaria uma 4a. Xícara antes de dormir.

Choveu o dia inteiro, sem trégua.   Não está dando para tirar muitas fotos legais, alguns lugares nem foram fotografados, como a cidade de “Dela Vega” e “El Ganso”.

            O caminho tem me mostrado como ficar em pé.
            E meu espírito tem me mostrado como posso voar!

Estou com saudade da Keila!

            Posso ler histórias que te façam dormir,
            Mas não posso sonhar por você.

            Posso estar ao teu lado quando você se ferir,
            Mas não posso sangrar por você.

            Posso até fazê-la se emocionar,
            Mas não posso chorar por você.

            ...muitas coisas eu poderei fazer,
            Mas algumas só caberão a você.

            Durante sua vida, muitos momentos existirão em que você sofrerá,
            E não haverá nada que eu possa fazer,
            A não ser... sofrer como você!
          LRDantas


23/10/2006
Tomei café da manhã (free), pão, doce de morango e café com leite.    Sai às 7h e 30 min, começou a chover logo em seguida.
 Esse senhor é o proprietário do Albergue... uma simpatia!
Na verdade, você quase que se sente em casa.

Estamos, aproximadamente, a 1500 metros de altitude, molhados e com frio.
         
Passei em Foncebadon, dois cães imensos caminhavam soltos pela rua; por incrível que pareça um era todo branco e o outro todo preto... me lembro de ter pensado: “é o equilíbrio yin-yang”.   O cão preto se aproximou correndo em minha direção, a foto não ficou legal, não sei se pela chuva ou se pelo medo.



O momento mais esperado chegou... “a cruz de ferro”, local onde as pessoas depositam “pedrinha” que trouxeram de seus países... quem fez o caminho até aqui tem deixa depositado aqui, simbolicamente através da pedra, um “grande pecado”, um “grande pecado”... muitos deixam seus pecados e seus pedidos.



Sai de lá bem mais “leve” - e não era em função do peso das pedrinhas que deixei – a chuva só parou 1 minuto, tempo para tirar algumas fotos.

Em Molina Seca, a chuva parou e um dia lindo surgiu, parecia um milagre.   Resolvi caminhar um pouco mais e parei em Ponferrada... 32 km.

Aqui se come o melhor lanche de todo o caminho... ela deixa saudade!
E não estou falando isso só porque ela é devota de Nossa Senhora... é a pura verdade!



O albergue é donativo, a maioria deixou 4 euros, e tem cozinha.
Sai para “descarregar” as fotos, comprei 3 pares de meia (1,80 euros) e comprei comida:
pão, 10 saches de Nescafé, chocolate, 6 bolinhos, doce de morango, linguiça, macarrão, iogurte, 2 molhos de tomate e 1 litro de suco de laranja.  Observação: é “irritante” comprar suco integral de laranja aqui e pagar 0,59 euros (menos de R$ 1,50), afinal, a Espanha não é um grande produtor, enquanto que no Brasil, país produtor, somos obrigados a pagar 3 vezes mais caro... alguém explica isso?

O jantar, para variar, foi macarrão... ficou ótimo!

A internet era doação, mas como ninguém doou, já que o governo “banca” pelo serviço... também não dei nada.

Coisas que irritam: Como os peregrinos sustentam boa parte desta região da Espanha, eles acabam fazendo algumas “sacanagem” com a gente, uma delas é “criar” percursos só para que passemos por alguns comércios locais – para que os sustentemos – o que torna, muitas vezes, o caminho bem maior.           Ao chegar em Ponferrada, há uma seta indicando o albergue “à direita”, e todos a seguem, foi o que fiz.   Depois de caminhar um monte numa descida que parecia não ter fim, tive que subir um bom pedaço para chegar ao mesmo lugar que estaria se tivesse seguido o caminho à esquerda... pô, “sacanagem” com o peregrino que está cansado de andar e ainda tem que passar por isso.

Dormi na “biblioteca”, o quarto que estava era para 4 pessoas, só que os 3 que estavam comigo pareciam “Os Três Tenores”, roncavam como se tivessem ensaiando para um concerto.   A biblioteca era quente e o sofá era maior do que a cama... me dei bem!

24/10/2006
Sai de Ponferrada depois das 8 h e cheguei em Villa Franca Del Bierzo às 16 h, caminhei devagar, parei demoradamente por duas vezes... fiz um dia “light”.
Café da manhã... albergue em Ponferrada
 Marco que fica no Jardim do Albergue


Ainda em Ponferrada
 Castelo no centro da cidade de Ponferrada

Me irritou, novamente, as “curvas desnecessárias” que nos obrigam a fazer.    Estava a 3,6km de Villa Franca quando uma seta indicou “virar à esquerda”, sai numa cidadezinha “Clitóris do Universo”; desci, subi, desci e subi novamente...  tudo isso para chegar no mesmo lugar que teria chegado se tivesse seguido o caminho reto naquela seta... isso é foda!    Andei uns 4km a mais.

O albergue é “donativo obrigatório”, 6 euros.   Tomei uma ducha super quente e sai para comprar comida.
Surpresa, antes de sair, o proprietário do albergue – Sr. Jesus – o “cara” que levará as mochilas até o Cebreiro, ele está comemorando 20 anos da passagem do Paulo Coelho por ali (é que sua filha é a menina que, no livro, encontra o Paulo e o leva até o seu destino), por isso, Brasileiros não pagam pelo jantar... ebá!

Tentaremos fazer um percurso bem longo amanhã, aproveitando que não estarei com a mochila por uns 30km.




Fui ao mercado para comprar algumas coisas para comer no café da manhã e durante o dia... estou tentando fugir de uma “galera” chatolina que insiste em nos encontrar.  Gastos 7,92 euros, comprei: Pão, suco de laranja, bolinhos com pêssegos, 1 litro de achocolatado, 3 chocolates, iogurte e doce de morango.

Tiago, Jesus (proprietário do Albergue) e Dan (eu)
Jantar "Free"... valeu Jesus!


“O poeta é um fingidor.   Finge tão intensamente que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente”.

            O poeta brinca com as palavras
            Com elas ele consegue fazer rir e chorar
            Pode fazer crer ou desacreditar
            Pode fazê-lo ver ou cegar

            Com as palavras o poeta pode mentir,
            Mas não pode a si mesmo enganar

            Cada um reconhece num poema aquilo que busca encontrar,
            Mas a verdade que vai na alma do poeta só a ele pertence
            E, muitas vezes, você pode estar a sorrir
            Com as mesmas palavras que, outrora, fizeram o poeta chorar.
                                                                              LRDantas
25/10/2010
Sai do albergue às 9h, sem mochila, já que o Jesus a levaria até o Alto do Poyo.   O Jesus adora brasileiros, falo isso, não apenas por nos ter oferecido o jantar (sopa, pão, vinho, chouriço, ovos e tortilha), mas por ele demonstrar isso o tempo todo... com as conversas, a atenção dada a nós... talvez seja tudo em função do livro do Paulo Coelho, seja como for, vale a pena passar por ali.

Esse é mais um albergue brasileiro... passei só para conhecer... 

Caminhei sozinho até o Cebreiro, subida, subida e mais subida.   Minha câmera ficou sem pilhas no meio do caminho e as reservas estão na mochila – que bobeira a minha – fique puto!

            Como posso expressar com palavras o que acabo de ver?
            Como posso com esses símbolos antigos criados pelo homem
   -  para expressarem a existência humana neste mundo -
            expressar a existência de Deus?
É, eu não posso!
LRDantas

Para qualquer um que tivesse visto o que eu vi, ouvido o que ouvi e sentido o que senti, a palavra Deus, certamente, não seria apenas uma palavra...   Santiago faz isso!
Mas não é preciso estar aqui para sentir isso.
O Cebreiro... 1300 m de altitude



Começou a chover logo após o Cebreiro, esfriou muito rápido.  Chegamos ao Alto do Poyo às 18h.    O albergue é donativo, as acomodações estão mofadas e o quarto parece um freezer... o aquecimento não funciona e já escureceu.     Como não tinha como saber se o próximo albergue – quilômetros à frente – teria vagas, tivemos que ficar por ali... foi a pior noite de todo o caminho, meus pés congelaram, mesmo dormindo com as botas... tive que ligar o chuveiro e jogar água quente sobre eles... que noite horrível!   


26/10/2006
Esse foi sem dúvida o pior albergue de todo o caminho... a pior noite!
(Quando refiz o caminho em 2010 ele já não funcionava mais... que bom!)

Sai do Alto do Poyo às 9 h e cheguei em Sarria às 17 h.   O albergue é donativo (4 euros), tomei uma ducha e fui comprar comida, como sempre.   Só havia  1 panela no albergue, mas o “rango” ficou legal... a sobremesa foi sorvete napolitano.

O dia foi o mais lindo dos últimos 8 dias, não choveu e fez o maior Sol... tirei belas fotos.   A caminhada foi forçada, cheguei as plantas dos pés bastante doloridas e tive que “furar” 2 bolhas... faz parte!





Uma coisa muito boa de se relatar é o tratamento que é dado ao peregrino por grande parte dos moradores desses lugares mais afastados... basta você dizer um "olá", para que eles comecem a puxar conversa... muitas vezes chegando a fazer uma parte do caminho ao seu lado.





27/10/2006

Sai de Sarria às 8 h e 30 min e cheguei em Portomarin às 14 h, foi uma caminhada leve, mas meus pés estão “baqueados”, o esquerdo tá muito dolorido e meus joelhos estão um pouco inchados.





           
A cidade é pequena – 3 supermercados – mas o visual da entrada compensa.  Não se vê pessoas bonitas na rua, mas tem cachorros por todos os lados.
         

O albergue é bacana, donativo.  Tomei um bom banho e sai para conhecer o local.


Essa igreja foi mudada de lugar, pedra por pedra, e os moradores adoram contar essa história, que se deu nos anos 60.

Em Portomarin, um dos produtos que eles produzem é a "Augardente", que eles dizem ser "a melhor, a mais saborosa e de fama tão extensa quanto a própria história da vida".    Existe até o dia em que se comemora "A Festa da Augardente coa Sereníssima Orde da Alquitara"... 
Uma coisa é certa, para quem faz o caminho na época "fria", vale a pena provar a "Auga que arde, que quenta o corpo e anima o espírito"
           A foto acima é da "Casa do Concello", no centro de Portomarin

São 20h e 35 min e já estou pensando em dormir.  A igreja foi mudada de lugar, pedra por pedra, dá para acreditar?

Usei a internet na biblioteca – super lenta – não tinha como acessar as fotos do CD.
Tomei um café com leite antes de dormir, a ideia é sair amanhã bem cedo e aproveitar o tempo bom que está fazendo.

28/10/2006
Saímos de Portomarin bem cedo e andamos aproximadamente 40 km até Melide, onde chegamos às 17h e 30 min.    Podem ver pelas imagens que o amanhecer foi fabuloso!



O dia amanheceu frio, mas não chovia... apenas garoava.     Ainda no albergue, antes de iniciarmos o caminho, fomos surpreendidos pelo sistema de iluminação, que não permitia que as luzes fossem acesas antes das 8 h, sorte que tínhamos lanterna (eu tinha achado uma “mag-light”, quando subia em direção à Cruz de Ferro).   Uma garota da Alemanha, Judith, estava tentando achar suas coisas no escuro e resolvemos ajudá-la, ela pediu para fazer o caminho conosco (comigo e com o Tiago), e foi o que ela fez.    Ela disse que, quando terminasse o caminho, iria para Fátima (Portugal), pois tinha tido um “insight” de que deveria ir.      Ela nos disse que aos 24 anos, quando viajou para o Egito, quase se casou com um egípcio que tinha conhecido por lá, mas que o Cônsul não deixou (Hoje, ela diz que dá graças a Deus por não conseguido).    Nos despedimos no meio do caminho entre Portomarin e Melide.



O albergue tem uma lareira que deixa o ambiente aconchegante, gostoso.   O pessoal que está aqui é muito bacana.
O albergue é donativo (4 euros), não quis cozinhar e fiz um lanche.

Essas duas são irmãs (são da Alemanha), estavam fazendo o caminho junto com seus familiares... é algo muito comum.

Faltam aproximadamente 51 km para chegarmos a Santiago, chegaremos lá na 2a.feira, mas gostaríamos de chegar lá no Domingo, mas não dá para andar 51 km com minha perna esquerda do jeito que está.

29/10/2006
O horário mudou em alguns lugares – alguns países da Europa – 1 hora a menos, e resolvemos aproveitar para sairmos mais cedo ( 6h e 30 min ).    Pelas “marcações” oficiais teremos 51 km até Santiago, pelos “guias” a distância é 56 km.

Observem o horário nas fotos... foram 10 km em 2 horas
Aqui eu disse "Adeus" ao "Azeitona-man"... essa capa ajudou muito, mas era muito quente!

O ritmo se mantinha... começávamos a acreditar que seria possível...  SANTIAGO ainda hoje!


Durante o caminho resolvemos forçar até o meio dia e ver até onde conseguiríamos chegar, chegamos a 24 km de Santiago.  Percebemos que dava para chegar hoje a Santiago e resolvemos fazer esse “absurdo”... caminhamos com apenas 3 paradas de 20 minutos... iríamos até Santiago!

O caminho foi de superação, tanto para mim como para o Tiago, estávamos no limite.

Quando chegamos ao Monte del Gozo - local onde está localizado o maior albergue para peregrinos de todo o caminho - dava para ver as luzes de Santiago e, embora muitos falassem sobre a “beleza” do local, resolvemos seguir até “as luzes” de Santiago.


Monte Del Gozo
Daqui até a Igreja, em Santiago, dizem que serão "apenas 5 km"... mas estávamos exaustos... os pés "pulsavam"... a mochila parecia estar com o dobro do seu peso (que já não era pouco)... mas iríamos até o "fim"!

Placa em homenagem ao Papa João Paulo II, que fez O Caminho


Lá fomos nós!     “Manquitolas”, adentrando a cidade... seria "o final do caminho"... ledo engano.     
Monumento na entrada da cidade de Santiago de Compostela

       

Quando mais nos aproximávamos da igreja, menos falávamos, o relógio mostrava o tempo que havia se passado deste o início daquele dia, 12 horas ( lembrando, foi apenas 1 hora de descanso).     Comecei a pensar em tudo que havia passado para chegar até ali... uma emoção começou a tomar conta de todo o meu corpo.   Quando a primeira parte da igreja ficou visível para o olhos... as lágrimas correram... é, a emoção é muito forte!


            O Caminho te “tira” e te “dá”,
            Porém ele te “mostra” e nada te “esconde”.

            No final vem a sensação de começo,
            Do Tudo e do Nada.
            Onde as lágrimas não se esgotam,
            Embora seu corpo esteja esgotado.

            O alívio se mistura com a dor
            E o canto incompreensível das missas em Latim
            É totalmente compreendido pela sabedoria da Alma

            O refrão é acompanhado, mesmo sem se conhecer as palavras
            Por alguns instantes todos somos Um
            Vibrando em uma mesma sintonia
            Somos regidos pela Fé
            Inspirados pelo Amor
            … somos tocados por Deus!
                                                                               LRDantas

Ao chegarmos bem próximos das escadas de acesso à igreja, sem que combinássemos nada, eu e o Tiago caímos, exaustos, com as mochilas nas costas... e um monte de gente passando em volta (alguns nos fotografando).

Assisti à missa das 19 h e 30 min, e o que aconteceu entre as 18 h e 30 min e as 19 h e 30 min, simplesmente não dá para expressar em palavras... obrigado senhor!

Terminada a missa fomos procurar um lugar para ficar.    Conversando com um Padre, ele nos indicou um albergue ao lado da igreja.    Tudo parecia muito bom, até chegarmos lá.   O albergue era para pessoas “normais” - não era para peregrinos – e só tinha gente “estranha”.   Um indivíduo se aproximou e começou a perguntar: “Mercedes?”, “Mercedes?”... tô fora, saímos de lá rapidinho!

Como meu pé estava “detonado” - depois de mais de 50 km – não conseguia caminhar mais nada.    Tínhamos o endereço de um albergue, mas demoramos uma eternidade para chegarmos lá... já era 23 h e o albergue estava fechado.   Toquei o interfone e uma voz disse que o albergue não abria mais este ano, e que eu procurasse outro lugar para ficar.

Eu tentei explicar, implorei para ficar em qualquer cantinho, afinal já era 23 h... mas a voz disse: “não posso fazer nada”.   Então, eu disse: é, realmente o senhor não pode fazer nada, fique com Deus o quanto pode, depois, vá pra...  (por alguns segundos "o caminho" havia sido esquecido)

A dor ficou insuportável, paramos numa praça, onde havia um local coberto e resolvemos ficar por ali.    Cochilei e acordei pouco antes da 1 h da manhã... estava um frio de doer!

Resolvemos caminhar até um outro albergue – que não sabíamos o endereço – mas sabíamos que existia.     Foram quase 50 minutos de caminhada e, ao encontrarmos no local, ele estava fechado, só abriria às 9 h, resolvemos dormir na frente da porta.   Quando estávamos cochilando, uma garota apareceu “trebada”, ela tentou abrir a porta e, como estava fechada, começou a gritar chamando alguém do lado de dentro... vieram abrir a porta e aproveitamos para entrar.   Só agora conseguiríamos dormir... e dormimos!

30/10/2006             
De manhã tomei um banho e sai para conhecer a cidade, iriamos voltar para a igreja e procuraríamos uma pensão, hotel, algum lugar para ficar que não fosse albergue.



Fiz a barba, já se passaram 3 semanas desde a última vez, estava tão “desligado desse lado vaidoso”,que não me via da mesma maneira ao me olhar no espelho.

Fomos assistir à missa do peregrino, isso foi ao meio dia... emoção total!   O “bota-fumeiro” foi usado... só quem assiste ao ritual consegue sentir a vibração que está presente no local.


         
Amanhã iremos para Finistere, queimar parte das roupas usadas no caminho... é um ritual que poucos fazem, mas é marcante!
Nos hospedamos numa pensão, é bem bacana, um quarto só pra mim... 15 euros.   Precisava deste “luxo”.


Já estava com a minha Compostelana em mãos!


31/10/2006
Fomos até Finistere... “Fim da Terra”.



Pegamos o ônibus às 10h e 30 min e chegamos lá às 12h e 15 min.    O lugar tem uma visão linda.    Fomos em direção ao local onde se faz a queima das roupas utilizados no caminho.   O dia estava bonito, ameaça chover, mas não chovia.

Caminhamos até o alto de um morro e durante o percurso um cão resolveu fazer companhia.   Eu comecei a chamá-lo de “Chouriço”, foram uns 6 km de subidas... e ele nos acompanhou.    Quando fui fotografá-lo, fez até pose!
Foi muito engraçado, ele nos acompanhou até o “Farol” e assim como surgiu “do nada”, também “desapareceu”... deve ter encontrado alguma “cadelinha” interessante.






 Momento em que executamos o ritual da queima das roupas usadas no caminho... nem tudo foi queimado!


Quando estávamos esperando o ônibus para voltarmos, um bando de gaivotas apareceu.... foi bacana!

Ao voltarmos para Santiago fui levar as cartas que algumas pessoas haviam pedido  para que entregasse a Santiago.   Embora fosse noite e a igreja estava aberta e pude fotografar melhor o túmulo do Santo.  Um funcionário da igreja me atendeu e me levou até a sala onde se deposita as cartas direcionadas ao Santo (fotografei o momento).
Aqui estão os restos mortais de Santiago



         

Ao voltarmos para a pousada que estávamos desde o dia anterior, o “senhorio” nos surpreendeu dizendo que o preço havia mudado, nos passou para um lugar sem cozinha... isso nos irritou.     Durante a noite o barulho estava insuportável, pois a janela dava para uma rua movimentadíssima... resolvemos sair de manhãzinha, e como não havia ninguém para nos atender... fomos embora sem pagar!

01/11/2006
Às 5h e 30 min fomos até a estação de ônibus, pegamos um que saiu às 6 h em direção a Madri... onde chegamos às 14 h.

            Já caminhei por um longo período na estrada sem fé
            Até me dar conta de que não saia do lugar

            Já sangrei e já sujei minhas mãos com o sangue
            Até perceber que esse não era o caminho

            Hoje talvez eu não seja o que esperavam que eu fosse.
            Hoje talvez eu não siga pelos caminhos que esperavam que eu seguisse.
            Hoje talvez eu não faça as coisas que esperavam que eu fizesse,

            Mas o que importa é que, mesmo não sendo o que gostariam que eu fosse
            - Ou o que eu mesmo gostaria de ser -
            Sou o que sou por minhas próprias decisões.
            Não sou perfeito, nem almejo ser
            Posso melhorar, quero melhorar e vou melhorar

            Não porque outras pessoas querem
            Mas, sim, porque eu quero

            Poderei cometer novos erros,
            Mas serão sempre “meus erros”

            Posso vir a desanimar muitas vezes, querer desistir,
            Mas, sempre que uma estrela brilhar, acharei motivos para continuar... pra seguir

            Posso até não recuperar o que perdi,
            Mas ninguém me impedirá de tentar
           
            No final eu poderei cair sem ter conseguido o que busco,
            Mas jamais me sentirei derrotado,
            Pois jamais abandonarei a batalha...
            Jamais deixarei de amar!

                                                                                LRDantas

            O Caminho havia “terminado”.


Quantas vezes serão necessárias?

Quantas vezes serão necessárias que o pássaro cante para que você o aprecie?
Quantas vezes serão necessárias que o Sol se ponha para que você o observe?
Quantas vezes serão necessárias que você perca para entender que a vida não é feita só de vitórias?
Quantas vitórias serão necessárias... ?

Quantos dias na escuridão serão necessários para que você resolva se mover e caminhar até à luz?

Quantas primaveras serão necessárias para que você comece a apreciar o perfume das flores?
Quantos dias de inverno serão necessários para que você resolva acender uma “lareira” no canto “frio” de sua alma?

Quantas pessoas terão que partir para que você aprenda a lhes dar valor antes que partam?
Quantas lágrimas serão necessárias para que você aprenda a sorrir?
Quantas mortes serão necessárias para que você aprenda a dar valor à vida?
Quantas vezes você lamentará o “partir” até que entenda que existirá um momento melhor, que é o “voltar”?!

Quantas pessoas terão que amá-lo para que você aprenda o que é amor?
Quantas pessoas você terá que amar...?

Quantos poemas você terá que ler para que entenda o sofrimento do poeta?

Quantas cores serão necessárias para que você aprenda que todas juntas são uma só?

Quantas vezes você terá que cair para que aceite que foi caindo que você aprendeu a  ficar em pé?!

Quantas palavras, gestos, momentos, sentimentos,..., serão necessários para que você aprenda que a felicidade que todos procuram não se encontra “fora”, mas, sim, dentro de cada um de nós?!

Quantas vezes você terá que nascer para entender que nada verdadeiramente morre?

Quantas religiões você terá que conhecer para entender que Deus é um só e que somos todos seus filhos?!

Então, quantos “caminhos” você terá que percorrer até perceber que o “maior caminho” a ser percorrido encontra-se dentro de você?!

Quantas vezes você terá que ler esse texto para compreender as palavras?  
Quantas vezes mais?
[...]
Quantas?
                                                                         LRDantas   


A felicidade é efêmera,
Mas não podemos nos esquecer que a tristeza é efêmera também!
O que torna um instante maior do que ele próprio é o querer.
E muitos lamentam as lágrimas, mas não fazem nada para que essas deixem de "rolar"!
LRDantas

Aos amigos que fiz no caminho, às pessoas que conheci/conversei/encontrei... vocês fizeram parte do "meu caminho"... fizeram parte da minha história, felicidades e paz no coração pra todos vocês!


                                      

4 comentários:

  1. lindo tudo !!!!!! as pessoas sao as que amamos .

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  2. amo vc ta !!!!!!!!! keila

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  3. Amei o relato da sua viagem à Compostela!!
    Desde que me tornei ciclista, alimento o desejo de fazê-la de bike!!!
    Muito lindas as fotos e acabei viajando através da sua história!!
    Parabéns pela conquista!!!
    E que venham outras...
    Um Abraço,
    Lilian Atkinson

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  4. Lilian, muitas pessoas fazem "O Caminho" de bike e posso te dizer que - como tudo na vida - tem suas vantagens e desvantagens. Encontrei um casal de Franceses que estavam fazendo (eles tinham mais de 60 anos!), e me lembro dela ter dito "fazendo O Caminho estou me sentindo 20 anos mais jovem, antes, com os melhores cosméticos eu só conseguia dizer que minha aparência estava 5 anos menos velha", ou seja... eles estavam adorando!
    Ah, quando você fizer o caminho... divulgue as fotos para que eu possa ver.
    Já fiz O Caminho duas vezes, mas não descarto uma possibilidade de voltar a fazê-lo daqui alguns anos... talvez de bike também.
    Abs

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